Feliz 2011!



O Bloggers Reign Supreme deseja um fantástico 2011 a todos os leitores!

Word is bond!

Graffiti Jam Session 2010@ Maia [14.11.2010]


Domingo, 14 de Novembro de 2010, testemunhou mais um grande dia para o graffiti nortenho.

Local do "crime", prédio da Maia, sítio emblemático para o graffiti da zona metropolitana do Porto. Um edifício de 4 andares, com a construção suspensa por motivos desconhecidos e que há mais de uma década vem disfarçando a sua deterioração com as obras de, pelo menos, duas gerações de writers.

Uma jam session que veio sendo organizada durante essa semana, de forma acertar uma data mais ou menos consensual, um tema e uma selecção coerente de cores.

Depois de um sábado tempestuoso, um dos maiores receios para esse dia seria o estado do tempo, apesar das paredes-alvo serem abrigadas da intempérie, já se sabe que o bom tempo traz consigo outra motivação para levantar da cama e marcar presença à hora combinada. Conclusão: S.Pedro curte graffiti porque a manhã de Domingo estava surpreendentemente radiosa.

Às 9:30 da manhã, já se viam as primeiras movimentações na Mecca do graffiti maiato. Sacos animados pelo chocalhar de latas começavam a ouvir-se. Tinta de rolo, rolos e escadas alinhavam-se para a primeira ofensiva que consistiu na cobertura de duas paredes a preto.

Rapidamente se passou dessa fase, perante o número de participantes depressa o preto tomou conta da decoração do R/c daquele edíficio.

A temática, combinada durante a semana, seria Fogo Vs Àgua, onde a magia de cada elemento se iria manifestar em duas paredes distintas, uma em tons de vermelho e outra de azul, respectivamente. Convém referir, que a tanto a "Fire Team" como a "Water Team" já se encontravam previamente definidas, de maneira a que os intervenientes trouxessem cores adequadas.

Lá pelas 11h, as equipas já tinham planeado entre si o plano de ataque e daí para a frente de pouco vale comentar porque as imagens falam por si.

Fotografias por : Sarah Miriam, Pedro Queirós e Bruno Mendes.

Mais fotografias em:

Mr.Dheo.com

Pedro Queirós Facebook

Bruno Mendes Picasa

Tribruto - Algazarra

Tribruto
Algazarra
Kimahera (Novembro 2010)


Tribruto (não “tributo”!) é o well known grupo algarvio composto por Kristo, RealPunch e o prolífero DJ/produtor Gijoe.

A primeira coisa que se me apraz dizer sobre este álbum é: FINALLY!

De facto, não me lembro da última vez em que um álbum tuga me cativou logo à primeira audição e não me fartou ao fim da segunda. “Algazarra” é daqueles álbuns que quando se começa a ouvir, fica-se logo estarrecido, tipo puto de cinco anos “uáu, tantas luzinhas!!”, e só depois se começa a perceber a que se deve tal nível de espectacularidade.

Para começar, neste álbum não há por onde começar. Ou seja, não há uma componente que sobressaia mais do que as outras, que chame mais à atenção ou que tenha mais qualidade. Por outro lado, talvez seja isso mesmo que marca a diferença em “Algazarra” – o facto de soar tão coeso, tão bem acabado (tão bem começado?), tão conquistador logo à partida.

É um álbum feito para curtir – mas não pensem já que isso significa que é “mais do mesmo”. Não, é dos poucos álbuns onde os instrumentais contribuem claramente para um elevado nível de curtição nos concertos, na medida em que estã cheios de batidas poderosas, samples inteligentes e scratch como já não ouvia há muito tempo.

E no que se refere às rimas? Cito logo a segunda faixa, com o mesmo nome do álbum: “Faço malhas onde malhas / acerto onde falhas / avanço onde encalhas / arrumo o que enchovalhas”. É mesmo isso – a nível de rimas, Tribruto consegue o que 95% dos álbuns de punchline não conseguem, isto é, consegue ir além da simples punchline trazendo evocações surpreendentes linha a linha. Onde a maioria dos rappers faz uma faixa de egotrip, outra de storytelling, outra de intervenção, Tribruto fazem todas as faixas de tudo. É egotrip E storytelling E punchline E intervenção E skill E flow E mensagem.

É um all you can eat hiphopiano!

“Posso entrar” é das cenas mais hilariantes que se ouviu no rap tuga. A sério. Se conseguirem ouvir esta faixa sem se partirem a rir, há algo de muito errado com vocês. Mad props para o Espectro por ter vindo lá de longe e se ter proposto a fazer uma cena assm! Ó Joe, fala lá com ele, que era fixe que ele voltasse a aparecer no próximo álbum.

“C-ngle”, com um beat daqueles que não deixa margem para dúvidas, está nos píncaros da rima, flow e skill. Contém uma das melhores pestações de RealPunch que já ouvi até hoje. Resumindo: flawless. Nos mesmos aspectos, Kristo sai mais destacado em “Tributo”. Mas estamos aqui a falar de incrementos na prestação marginais, porque na big picture, há poucos colectivos de rap tuga que funcionem tão bem juntos como este.

“Ar Decôr” é um caso raro. Passo a explicar: é das poucas faixas com a participação de Perigo Público em que este não eclipsa completamente os mcs anfitriões. Pelo contrário – estão todos em casa, estão todos ao mesmo nível (elevado!). Aliás, o mesmo torna a acontecer em “Apanhado do clima”, mas com Nerve como convidado. O trio RealPunch, Kristo e Nerve juntam-se para matar o beat de GI Joe numa faixa que consideraria das melhores do álbum, a par com as anteriomente mencionadas.

Para mais awsomeness, consultar “À nossa volta” (com um beat que ofusca), “S.F.U” (where my indies at? Reconhecem a quote inicial?) e “R.U.A.”, com WTR, faixa que tem uma surpresa especial no fim, que me faz rir sempre, mesmo ao fim de mais de dez audições. É a dica de introdução para “Questões”, que pelos vistos é uma especialidade para o convidado de honra, “Reflect”.

Outras músicas com registos um pouco mais diferenciados, como “Money comes to you” e “Cinco dedos, cinco sentidos”, “Dizem-nos muito pouco”, com Nessa e Sacik, “O que me apetece” contribuem para a diversificação da sonoridade de “Algazarra”, provando que GI Joe, Kristo e RealPunch não são rapazes de um só truque.

“Comes e calas” fecha o álbum, no registo característico de Tribruto que nos deixa uma mensagem muito clara: punchline não é para meninos.

Imperdível.

Algumas Reflexões... O Poder do Ouvinte

Há gente que abomina o rap. Alguns simplesmente apreciam um ou outro artista, uma ou outra canção. Há consumidores de música que ingerem o rap da mesma forma com que se alimentam da Pop ou do Rock. No entanto, os adeptos do rap, eles mesmos, não são de forma nenhuma homogéneos na forma de senti-lo. Neste âmbito, pode-se ainda extrapolar as diferentes pontas do rap, desde o underground ao mainstream, do indie ao gangsta, do culto e poético até ao de rua, mais cru.

De entre todas estas variantes, algumas fazem a apologia da violência ou, pelo menos, ela está incluída no rol de assuntos predominantemente tratados. Ora, há quem gostasse e desejasse banir e censurar vincadamente tal temática na música. Até porque o Hip Hop é festa, é promoção de paz, é isso que está inscrito nos seus princípios.

Retrato da sociedade, forma artística ou expoente da liberdade, a música é peça vital, é sangue mesmo, para qualquer pessoa. Ninguém vive sem música. Toda a gente a ouve, independentemente dela ter qualidade ou não. Assim, a música é depositária de tudo quanto possa haver neste mundo. Mas pode ou deve impor-se uma cartilha de assuntos tratáveis na música ou cada um deve ser livre de viver, no fundo, essa liberdade soprada pela própria música?

Discriminação pela cor da pele e pela sexualidade, exploração emocional, violência, manipulação, guerra, violação dos direitos humanos... Há aspectos errados mas arreigados na sociedade que deslaçam a civilização. Tornamo-nos pessoas cada vez mais insensíveis, egocêntricas, egoístas e distantes. Quantas vezes já escutamos, por exemplo, num rap uma calúnia contra as mulheres? Vezes sem conta, infelizmente. Será esta a liberdade que imaginamos quando pretendemos a música sem amarras?

A nossa sociedade valoriza cada vez mais a aparência em desfavor do conteúdo, o materialismo em desprimor do saber, à medida que a universalidade ao invés de fomentar a abertura de mentalidades oprime certos aspectos pelo franzir da intolerância e pelo virar de costas que é o preconceito. Ultrajar contemporaneamente é um modo de vida para muitos. Elevar a arte, qualquer que ela seja, é tarefa apenas de um restrito grupo de iluminados que permanecem firmes na crença de que vale a pena lutar por algo superior, que nos faça sentir perto dos deuses.

Quem liga a MTV, assiste com espanto à apologia do fútil que faz do livro de cheques e do registo de propriedade o termómetro indicado para a medição da sua valia pessoal. O que é um claro contra-senso com uma forma artística como a música. A arte é a desenvoltura do intelecto, não a balança que pesa o volume do que se tem nos bolsos.

Noutro particular, existe também a inveja. É bem mais fácil invejar do que tentar chegar-se a um determinado patamar. Em muitos casos, chafurda-se na abulia, definha-se na negatividade, por não se conseguir ser muitas vezes alquimista e transformar a energia que nasce em nós em algo positivo. É mais fácil odiar do que amar porque o ódio é destruir ao passo que amar é construir. E há o trabalho. Nada se constrói sem trabalho, sem dedicação e persistência. Quando estes elementos se juntam há um mistério no Universo – a que alguns chamam sorte – que congrega esses factores para que eles resultem.

A música tem um estrondoso impacto na consciência colectiva, influenciando-a portanto nas suas convenções quer positivas quer negativas. Daí que seja essencial que os artistas usem o poder que têm responsavelmente. Mas como sabemos que o Pai Natal não existe mas ele entra-nos casa adentro todos os anos, teremos então de ser nós, os ouvintes, os garantes da saúde da música e tratar de fazermos a triagem devida. Nenhum artista vingará se não lhe dermos importância. É uma questão de afirmarmos a nossa escolha e de não estarmos à espera que nos impinjam quem quer que seja.

Deve servir a música para que nos tornemos melhores pessoas. Deve ela inspirar-nos certos valores que norteiem os nossos dias. Concluindo, parte do ouvinte aceitar e legitimar certos tópicos reflectidos na música. O gosto é sempre validado pelo público e a música que temos resulta desse gosto da maioria. Por isso, é que é cada vez mais urgente e importante que sejamos exigentes com o nível musical dos artistas para que advenha daí a qualidade que todos nós pretendemos e que essa se sobreponha à decadência sonora que por aí ondula.

Um MC Competente Inconsciente


Frequentemente, quando nos pedem a opinião sobre um MC que começou a rimar há relativamente pouco tempo, é-nos difícil fazê-lo. Por vezes, os temas são demasiado dejá-vù e as rimas estão mal construídas. Por outras, denota-se um esforço por fazer palavras rimar implícito na maneira como as rimas estão arquitectadas. Em qualquer dos casos, denota-se sempre que há uma grande disparidade entre os MCs mais evoluídos e aqueles que ainda estão a aprender.

Há determinadas fases pelas quais um MC tem de passar se quiser dominar o processo de escrita e conseguir-se expressar da melhor maneira, combinando a forma como escreve com o skill e flow que só vem com o tempo e a aprendizagem. São elas:

Incompetente Inconsciente
O MC tem dificuldade em escrever para um beat, quando grava fica fora de tempo, tem um flow quadrado que nunca varia e nenhum skill. Vai gravando sons que não lhe soam bem, mas não se apercebe porquê nem o que pode fazer para melhorar. Não entende onde é que está o problema. Será o flow? Será a dicção? Será o beat? Ele é incompetente porque não consegue dominar o beat e inconsciente porque não consegue descobrir porquê.

Incompetente Consciente
Nesta fase, o MC começa-se a aperceber de alguns factores chave para que as gravações comecem a soar bem. Apercebe-se que há certas alterações que pode fazer na forma como escreve que lhe dão mais liberdade no flow: já não escreve rimas 4x4. Descobre novas formas de fazer os versos rimar. O processo de descoberta e melhoria faz-se através da emulação de truques que escuta noutros MCs. Reproduzindo-os, desvenda as engrenagens da arte. Ainda que continue incompetente, pois ainda não é capaz de inovar e precisa de recorrer ao que já existe para evoluir, já está consciente dos aspectos em concreto que precisa de melhorar. Sabe onde procurar.

Competente Consciente
À medida que se vai familiarizando com os processos de criação, começa a adquirir as ferramentas para fazer exactamente o que tem em mente. Já não é escravo do pouco que sabe fazer – já é capaz de construir e inovar, fazer coisas que nunca tinha feito antes. Compreende que o beat lhe dá um contexto e pode favorecer determinado tipo de flow, e que esse tipo de flow pode ser explorado da melhor forma com determinado tipo de rima. Mas ainda precisa de fazer um esforço consciente para conjugar todos esses factores, o que leva a que certas músicas soem mecânicas, demasiado tecnicistas e com falta de fluidez. Já sabe como fazer o que quer fazer, pelo que já se tornou competente, mas ainda não ganhou os automatismos necessários à arte de rimar, pelo que ainda se nota um esforço consciente.

Competente Inconsciente
Estes MCs ouvem o beat e, quando escrevem, já têm na cabeça que tipo de rimas querem e como vão colocar o flow. Ainda antes de gravar, a música como um todo já existe dentro da sua cabeça. Conseguem-se focar unicamente na mensagem que querem transmitir, pois a escrita, o flow e o skill já lhes saem automaticamente. Todo o esforço está orientado no sentido da inovação e da criatividade. As rimas soam fluentes, quando os escutamos estamos a ver um filme sem sequer nos apercebermos que as coisas estão todas a rimar e que o flow está milimetricamente colocado. Só somos surpreendidos quando o MC escolhe surpreender, e não porque determinada rima não lhe saiu bem ou porque o flow descarrilou. A sua competência é já inconsciente, é um automatismo que lhe permite a liberdade para o nível seguinte.

Eu diria que poucos são os MCs na tuga que se encontram no estado de Competência Inconsciente. E a maioria deles, nem sequer são muito criativos. O facto de já dominarem todos os aspectos do MCing e portanto terem a liberdade para inovar, não quer dizer que o façam ou sequer que sejam capazes de o fazer. Mas quando os escutamos, sentimos que rimar, para eles, já é tão natural como respirar.

No outro extremo, temos muitos MCs, principalmente da nova escola, que se preocupam muito com a inovação sem antes se dedicarem a aprender a dominar todas as ferramentas necessárias. Perdem demasiado tempo à procura do assunto sobre o qual nenhum MC falou ainda, mas escrevem barras com palavras a mais, saem de tempo, perdem o focus do tema para forçarem a rima ou perdem o focus da rima para forçarem um tema.

Um bom MC pode atravessar estas quatro fases mais depressa ou mais devagar, mas tem de o fazer obrigatoriamente. Repetidamente. A quarta fase não é um estado, é um ciclo, pois assim que MC descobre uma nova limitação, torna a percorrer o ciclo. Nunca acaba.

Um MC medíocre chega à terceira fase e volta à primeira – limita-se a limar algumas arestas antes de cruzar os braços e se declarar o melhor MC do mundo, tornando-se assim inconsciente da sua incompetência.

Um mau MC nunca sai da primeira fase – e é destes que temos às carradas, povoam a maioria das net tapes que por aí circulam com egos do tamanho do mundo e sem qualquer noção das suas limitações.

Mais do que uma forma dos “críticos” analisarem os artistas, eu diria que a verdadeira utilidade deste modelo (muito utilizado em psicologia) é ser uma forma de auto-aprendizagem.

Black Milk - Album of the year



O príncipe de Detroit está de volta com o seu aguardadíssimo terceiro disco. Com um início de carreira auspicioso, cedo foi rotulado como o substituto natural de J-Dilla, isto ainda num período de luto pela estrela maior da cidade e também num de hibernação criativa de todas as outras referências ( Slum Village, Eminem, Royce 5'9, entre outros).

Muito antes de os seus discos a solo seres referenciados, a este já cabia a responsabilidade de produzir para um grupo tão mediático quanto Slum Village, a par do seu colega Fat Ray, o outro membro da dupla B.R.Gunna.

Como ficou subentendido no primeiro parágrafo, o disco de estreia Popular Demand foi o suspiro de alívio para aqueles que não acreditavam numa reformulação tão imediata da Motown.

Entre a estreia e o "difícil segundo álbum" B.M. tornou-se num dos rookies mais desejados do "draft" de produtores, desmultiplicando-se em participações, não só nas batidas como nas rimas.

Se em Popular Demand ainda se falava na proximidade com a sonoridade imposta por Dilla, já Tronic foi mais uma prova de que Black Milk pretendia ser dono e senhor do seu próprio destino, afastando-se do rótulo e do fardo que lhe pretendiam colocar. Tronic, como o próprio nome indica, resulta de influências mais orgânicas e electrónicas, relegando para segundo plano os orelhudos samples soul ou de funk. Nesta altura, Black Milk já demonstrava um grande apreço por baterias expressivas na sua fórmula. Um caminho que tem vindo a explorar imenso, de tal modo que já se tornou numa das suas imagens de marca. Tal como no cinema se fala em "cinema de autor" aqui podemos aplicar a analogia a " produção de autor".

"Album of the year" mais que uma designação pretensiosa para um título de um álbum é, na realidade, o retrato musical do último ano da vida do artista, tal como o mesmo refere logo na abertura. E talvez não seja por acaso que o disco tenha apenas doze faixas. Doze temas que perfazem uma viagem sonora de 55 minutos onde se encontram diluídos acontecimentos relevantes na vida de B.M.

"365" abre as hostes num tom retrospectivo e esclarecedor do verdadeiro intuito do disco. Aqui nomeia alguns factos pessoais marcantes nomeadamente a morte de Baatin, membro fundador dos Slum Village.
"Welcome (Gotta go)" e "Keep Going" seguem a mesma dinâmica inicial, aparentando até alguma anarquia resultante de uma qualquer jam session que pode provocar alguma estranheza inicial, embora comece a fazer sentido após sucessivas audições.


"Oh girl" representa o típico hino ao sexo oposto, que certamente, também deve ter tido um papel bastante significativo durante último ano do produtor/rapper.
"Deadly medley" traz uma troca de punchlines entre intervenientes, provavelmente, o trio mais mediático de Detroit do momento (excepto Eminem), ou seja, Black Milk, Royce e Elzhi, estes dois últimos representando duas eras do HipHop da cidade. Também em "Black& Brown" há troca galhardetes com entre B.M e Danny Brown, uma personagem que tem vindo a fazer um buzz interessante no underground americano através de pequenas participações como esta.


"Round of applause" soa a algo já conhecido no reportório do produtor pois trata-se de um tema muito semelhantes ao single de Tronic, "Give the drummer sum". Aliás esse single enquadrar-se-ia perfeitamente no alinhamento deste disco.

Na combinação de dois aspectos essenciais: escrita e produção. Album of the year é a colheita de mais apurada de Black Milk e onde este binómio melhor se conjuga.


A produção, tal como foi dito, é o aspecto mais destacável porque marca definitivamente um estilo próprio, um carimbo sonoro que nos permite (já) identificar o seu "toque" tão naturalmente como identificamos uma batida de Premier, Dre ou Timbaland. (reparem que no final de cada faixa a duração desta prolonga-se mais que o habitual até acabar em definitivo, quase como se o autor quisesse um parte inicial rimada e uma final só instrumental)

Já no que toca às rimas, o discurso está mais assertivo e confiante. O flow está mais perpicaz e maleável, com uma maior preocupação na dicção devido às rimas internas, agora mais exploradas.


Quanto ao conteúdo, é pena Black cair na redundância do egotrip e da rima livre onde o ouvinte se acaba por perder a meio e se deixa levar apenas pelo apelo da batida.
Embora não seja surpresa nenhuma, um produtor/ mc se destacar em apenas um dos campos, pois encontrar um excelente produtor e mc é tão provável como encontrar um excelente futebolista ambidestro.

"Album of the year" certamente que não será o disco do ano, apesar de ir constar na lista de nomeados. Mas, ficou patente que Black Milk é um dos produtores mais prolíferos e vanguardistas do HipHop contemporâneo.

Nota: na review foi considerado Popular Demand como disco de estreia de Black Milk, apesar de algumas fontas considerarem que esse tenha sido já o seu segundo disco oficial.

Myspace: Black Milk

RIP Eyedea

A crew BRS manda respeito para o eterno ícone indie Eyedea.


Foi sem dúvida um dos artistas que mais influenciou a cena indie. RIP Eyedea.

Reportagem: Body Rock Crew, Mau Feitio, Mundo, Termanology e AZ no Hard Club (08/10/2010)

A noite de 8 de Outubro de 2010 vai ficar certamente na história do Hip Hop português como uma das mais memoráveis de sempre. Um cartaz de luxo, uma casa fantástica e cheia, excelente ambiente e rap de primeira água. Que pedir mais? A repetição de festas como esta naturalmente.

O Hard Club, no Porto, engalanou-se arquitectónica e humanamente para acolher Body Rock Crew (Maze, D-One e Deck97), Mau Feitio, Mundo Segundo, Termanology e AZ. O interesse estava no auge para se perceber se o público respondia ao convite de agraciar os artistas nacionais e os americanos com uma recepção que se queria bem quente. Se o NGA é mais quente que o fogo, o Hard Club esteve ainda mais quente que o NGA então. Verdadeiro vulcão de emoções que se viveu naquele espaço, com o público a corresponder em número ao nível vibrante do cartaz em questão: 8.9 na escala de Richter.

As pessoas foram sentindo o faiscar da festa com Body Rock Crew, que enviou autênticas guloseimas para audição sem se importar que os presentes se empanturrassem naqueles sabores clássicos, quando ainda tinham um banquete para degustar. Foi mesmo assim. Os concertos foram uma mesa cheia que o palato de todos provou e aprovou. Mau Feitio foram a entrada calórica quanto baste, distribuída pelas doces batidas de D-One e as rimas de Capicua e de Auge. "Apetece" pareceu ter tido a maior aceitação de todo o cardápio por eles servido. Destaque para as participações especiais de Cooper, Deau (que saiu da plateia) e de M7 na actuação de Mau Feitio, que vieram conferir ainda mais riqueza à prestação do grupo. Este esteve em bom plano, conforme nos vem habituando e foi a entrada perfeita para o primeiro rap que se escutou ao vivo na noite.

Depois seguiu-se Mundo Segundo acompanhado por DJ Guze e Each de Enigma Crew. O MC de Dealema foi feliz na escolha do alinhamento para uma noite tão especial, interpretando alguns dos temas mais marcantes do seu trajecto a solo para loucura dos presentes. Contou ainda com o préstimo de Maze, seu comparsa dealemático, e de Ana, a jovem cantora que adocicou o refrão do clássico "O Que É Feito?". Os braços no ar foram uma constante e os gritos de satisfação idem aspas. De referir que Mundo Segundo foi o rei da noite. Ainda antes de os americanos actuarem (devem-se ter pasmado com a idolatração por Mundo), o público atingiu o ponto máximo de ebulição com o rapper tripeiro, que teve uma performance muito boa e galvanizadora.

O primeiro americano a entregar-se à assistência do Hard Club foi Termanology. O rapper teve uma excelente entrega, pautada por muita energia, entusiasmo e comunicação com o público. Logo aí marcou pontos. "Real Hip Hop is here", disse Termanology. Saíram pelas colunas da sala alguns temas clássicos da sua carreira como “How We Rock” ou “So Amazing”, respondendo os presentes com alegria ao que iam vendo e ouvindo. E não era para menos. É que perante toda a plateia ia-se exibindo não só as rimas de um dos mais entusiasmantes emcees da nova escola norte-americana, como também alguns beats de autoria de DJ Premier, que dispensa qualquer tipo de apresentação. Contudo, por muito que a gente idealizasse Preemo por detrás da mesa dos pratos, a verdade é que o DJ que realmente acompanhou Termanology fazia questão de vincar a sua presença com uns irritantes disparos sonoros que cessavam cada som.

Durante a actuação notou-se perfeitamente o prazer de Termanology devido ao carinho que lhe foi sendo dispensado. Ele que há tempos, em Vigo, actuou perante uma sala (quase) vazia, no Hard Club deve ter ficado bem impressionado com a atmosfera intensa e vibrante com a qual foi confrontado. Para êxtase dos portugueses, "Watch How It Go Down" foi naturalmente a malha que fez explodir a sala antes da despedida do emcee do palco. Muito boa actuação de Termanology. We love you too, m*therfucker!

Por último, actuou o originário de Brooklyn AZ. Era alta a expectativa sobre esta lenda do rap norte-americano. AZ não teve o fulgor de Termanology mas mesmo assim foi fantástico assistir ao vivo à prestação do mítico rapper. Pelo adiantado da hora e cansaço do público (?), havia algumas clareiras entre a assistência durante o concerto de AZ, mas foi aqui que eclodiu um moche que deixou Termanology (assistindo ao show no palco) impressionado com aquela situação e foi prontamente filmá-la. AZ percorreu a sua vasta discografia, fazendo girar alguns clássicos, particularmente do seu álbum de estreia “Doe or Die”, que foram muito bem acolhidos. Houve tempo também para “Life’s a Bitch”, uma das melhores canções de todos os tempos do rap mundial, que sentida ao vivo emocionou toda a gente. AZ não tendo exibido a garra de Terma deu no entanto um bom concerto. Pena que o público tenha começado a debandar e nem sempre tenha “feito o barulho” que AZ talvez esperasse. A espaços, AZ presenteou os presentes com sons clássicos do Hip Hop internacional, não se coibindo de homenagear, por exemplo, Guru. Apesar da prestação um pouco abaixo da de Termanology, foi mágico presenciar o show de uma lenda viva do rap mundial.

Em resumo, a noite do Hard Club foi muito boa. Registaram-se belas actuações e um grande apoio do público do Hip Hop, que compareceu em peso na casa. Foi importante que os artistas americanos tivessem sentido que o Hip Hop está forte aqui e que é feito com entusiasmo e com a presença em massa de pessoas nos concertos. Tudo isto é vital para que se mantenha a esperança de que seja possível trazer mais rappers americanos a Portugal e que eles estejam interessados em passar por cá. AZ e Termanology terão saído satisfeitos com o afecto do público mas talvez se tenham admirado por Mundo ter sido mais aplaudido do que eles. Mundo foi aquele que fez a multidão agitar-se mais. Espectacular noite! Que se repitam muitas mais assim no Hard Club.

Os vídeos da Urban Beat Battle


















Reportagem: Urban Beat Battle, Gare Clube, Porto (07/10/2010)

E o vencedor da Urban Beat Battle é... Cálculo! Pois é, o produtor e MC de Barcelos assumiu-se como o preferido do público e bateu a feroz concorrência que lhe foi aparecendo pela frente. Numa competição com excelentes surpresas, a luta foi sempre bastante renhida e o nível muito alto. A festa foi boa, com vários pontos de interesse, o público respondeu à chamada e fez-se história na cidade Invicta com o despontar deste evento.

Os dezasseis concorrentes na batalha de beats tinham de convencer o público de que eram os melhores para passarem as eliminatórias, já que era esse mesmo público que com o seu grito decidia quem seguia para a ronda seguinte. O método de votação era simples, embora todos possamos questionar a sua fiabilidade em eleger realmente os melhores. No entanto, eram as regras e todos sabiam para o que iam.

Algumas eliminatórias foram memoráveis e quase todas elas envolveram... Cálculo. Ao longo da caminhada triunfal do barcelense, tanto caíram beatmakers com pouca projecção no panorama nacional - como BeatOven -, como também tombaram artistas com bastante peso na arte de reproduzir beats, nomeadamente LT a.k.a. Philly Gonzalez (que começou por vencer Jowdjo, de Aveiro). Tal como o produtor de Matosinhos, também D-One surgiu no Gare Clube bem posicionado na tabela de apostas para esta Urban Beat Battle. D-One actuou em casa, mas até na China lhe reconheceriam grande valor na hora de bater com os dedos nos pads. Que o diga Alpha e Supremo G. O primeiro, do colectivo Recarga, por ter sido abatido logo na ronda inaugural, e o segundo por não ter pejo em “comprar” logo ali o primeiro instrumental rodado por D-One. A participação deste findou aos pés (leia-se beats) de Cuss, que disparou para a semi-final após um duelo estrondoso (que pareceu uma final antecipada, pode-se dizer assim). Amparado pelo autocarro humano proveniente da Póvoa de Varzim, e pelo seu inegável talento para as batidas, Cuss galgou dois opositores até confrontar-se com Cálculo. A gladiação instrumental entre os dois foi estupenda, com ambos a exibirem-se num patamar realmente elevado.

De sublinhar a juventude de alguns participantes (como a de LiL’P. Beatz, de apenas 16 anos), que contrastou com o nível de maturação demonstrado nos beats. Da capital para a Invicta, M.A.N. granjeou chegar à final exibindo um estilo muito singular nas batidas. Na meia-final, o adversário deste, Cooper, revelou-se mais artilhado do que qualquer outro participante. Isto porque à passagem de uma batida de sua autoria, esta incluía igualmente uma a capella, algo obviamente descontextualizado numa competição de... instrumentais. Foi graças à generosidade de M.A.N. que Copper teve oportunidade de se redimir com um último beat, mas o talento do moçambicano radicado em Lisboa já tinha reservado o último bilhete para a final.

O derradeiro duelo também foi muito bom, com Cálculo a suplantar M.A.N. no ruído proveniente da plateia. De realçar o carácter requintado dos samples do representante da terra do “pé na porta”, que conquistou a maioria dos presentes, mesmo aqueles que estavam pouco familiarizados com as suas produções. Não menosprezando nenhum concorrente, já que todos eram verdadeiramente hábeis na arte de bulir nas MPC’s (ou MPD’s, etc...), salientamos ainda as participações de Alpha, Mekie e Noyse.

Relativamente ao sistema de votação, apenas se pode especular em duas situações, curiosamente envolvendo Cooper. Numa eliminatória entre o representante de Gaia e Mekie, o segundo pareceu ser mais convincente na qualidade das batidas, mas o ruído foi superior para Cooper. Depois entre Noyse e Cooper quando se previa que ambos teriam que rolar mais um instrumental para um desempate, Cooper ganha surpreendentemente quando parecia até que a audiência se manifestou mais por Noyse. Mas podia ter sido perfeitamente uma ilusão... auditiva.

Cálculo tornou-se assim o primeiro vencedor deste evento, tendo o atractivo de ceder um instrumental para Valete compor um tema. Valete, que tal como Maze, esteve presente no Gare Clube, ainda que nem sequer tenha subido ao palco ou proferido qualquer palavra. Os finalistas (Cálculo e M.A.N.) levaram ainda prémios para casa, numa oferta da Plastic Sounds.

Antes da competição e intervalando as diferentes fases da mesma, houve tempo para se escutar DJ Player (o cicerone principal de toda a noite), Supremo G, JêPê, Rusty, Contrabando88 e ainda uma jam session de Poeta de Rua. Com maior ou menor entusiasmo, a plateia aderiu bem ao esforço e talento dos artistas que animaram a festa. Supremo G e JêPê percorreram algumas faixas de "Live On Stage" e de "A Caminho da Lua", o próximo trabalho de Jimmy P. Como sempre, onde quer que actue Contrabando88, a tropa de apoiantes não os deixou sozinhos e fez com que se sentissem em casa.

Palavras finais para a organização do evento que trabalhou muito para que tudo corresse da forma mais perfeita possível. Reis e Fisko merecem a nossa congratulação pela iniciativa, pelo empreendedorismo de fazerem em Portugal um evento primeiro com estas características e depois com esta qualidade. Parabéns a todos os concorrentes, ao público que compareceu e aos artistas que actuaram. Da parte do BRS, enviamos um abraço muito especial ao Fisko que nos tratou de forma impecável. Foi uma honra o BRS estar associado a este evento. Parabéns Hip Hop português!

B-Girl - Review do filme (COM SPOILERS)


B-Girl é um filme cujo título é bastante auto-evidente. Podem encontrar todas as informações do mesmo aqui: http://www.bgirlmovie.com/

Este é um filme com muitas coisas para dizer. E isso é bom - quer dizer que os aspectos positivos são suficientes para que o filme valha de facto a pena ver.

Para quem não viu o filme atenção - esta review tem spoilers.

A história do filme, genericamente, pode-se resumir da seguinte forma: Angel, uma B-Girl, é atacada pelo ex-namorado psicótico, que a esfaqueia nas costas, e tem de fugir de Brooklyn para LA, onde recomeça toda a sua vida de B-Girl enquanto ultrapassa o trauma e a limitação física. Inclusivamente após o ataque covarde, o próprio medico afirmou que, caso Angel não tivesse a preparação atlética de b-girl, as consequências do ataque teriam sido mais severas.

Este filme consegue estar no limiar do aceitável, na medida em que os pontos positivos são suficientes para compensar os aspectos mais negativos. Mas ainda assim, vale a pena fazer uma análise detalhada, para que eventuais projectos futuros possam colmatar as falhas que se verificaram neste trabalho e possam inspirar-se naquilo que correu bem.

Começando pelos aspectos positivos:

1. Tempo de antena para o breakdance - Sem grande ângulos de câmara que poderiam dar mais sensação de movimento, mas que também nos tiravam a sensação de estarmos a assistir a uma battle ao vivo. O momento alto do filme, em que as crews que chegam à final se confrontam, nesse aspecto está soberba.

2. A B-Girl - não se limita a fazer poppin and lockin. Ela breaka a sério! Não se veste de cor de rosa, não treina de maiot e colans, não usa perneiras, não ouve RnB. That’a’girl.

3. O segundo personagem principal também não está mal de todo. Não é um dread dos subúrbios que anda na droga por peer pressure e que lá no fundo até é boa pessoa. Não, é um professor numa escola, mas que não é por isso que deixa de ser real e de manter o gosto pelo breakdance.

4. Na abertura da battle, a B-girl faz uma espécie de acapella sobre ser B-girl que deve ter sido escrito por alguém com muito jeito para poemas - é das melhores partes do filme em termos de guião.

5. A banda sonora - Está bastante fixe, sem autotunes nem nada disso.

Agora os aspectos negativos que, valha-nos deus, são mesmo maus.

Toda a história parece uma desculpa mal engendrada para pôr uns gajos a breakar com uma gaja, que pode não se vestir de cor de rosa e com calças justas, mas tem um street name bué de meter respeito (“Angel”) e bué diferente do seu nome verdadeiro (“Angela”).

Aquilo a que chamamos em inglês “plot devices” (como chamamos em português?) são mesmo, mesmo, mesmo maus, óbvios, forçados e previsíveis. Coisas como:

- Angel está numa festa com a sua melhor amiga que é latina e o seu ex-namorado vem dizer “ah e tal vamos voltar” ao que ela responde “não! está acabado!”. Angela e a amiga vão para a casa de banho e trocam de chapéu e de casaco porque Angela tem medo do namorado (embora não se perceba porquê). Saem juntas do clube, pela porta das traseiras. Angela é loira, caucasiana e veste-se de roupa larga, a amiga tem cabelo preto, é latina e veste-se de salto alto e roupa justa. O ex-namorado, que estava à espera delas cá fora, deve ser completamente cego porque apesar da diferença evidente na maneira como se vestem, precisou de agarrar e esfaquear a amiga de Angela na barriga, mesmo com ela a gritar e tudo (nem pela voz lá foi!) antes de perceber que não era Angela. Ao aperceber-se do erro, que faz ele? Não, não mata Angela, a pessoa que ele queria de facto matar. Dá-lhe um cortezinho no ombro, fica muito perturbado, e vai-se embora.

- Angela muda de cidade porque tem medo que o ex-namorado a volte a atacar, apesar de bastar trocar de chapéu e casaco de vez em quando para o ex deixe de a reconhecer.

- Na nova cidade, Angela descobre rapidamente uma nova crew. No primeiro encontro, uma das gajas que para lá estava (afro-americana), que nem sequer é b-girl, levanta-se e dá-lhe um granda empurrão, completamente do nada. Cria-se uma rivalidade estúpida, que é resolvida rapidamente e de modo igualmente estúpido. Do nada, a gaja passa a adorar a Angel e convence os outros gajos a deixa-la entrar na crew.

- No meio do filme, de repente Angela está traumatizada e culpabiliza-se pela morte da amiga. Mas só durante o minuto e meio em que tem um pesadelo, que depois vai dar jeito para conhecer o professor, que é o gajo que anda a treinar a crew a que ela se junta. De resto, Angela anda fresca que nem uma alface.

- Igualmente do nada, a mãe de Angela começa a beber e é alcoólica. Mas também é alcoólica por cerca de 30 minutos, pois assim que vai chatear o professor-bboy por andar a levar a filha pelos maus caminhos do breakdance que a levaram a ser esfaqueada, passa-lhe logo tudo e fica outra vez uma pessoa normal.

- O evento final é apresentado pelo host como “um evento com crews dos vários cantos do mundo”, quando na realidade só se vê uma battle de todo o torneio, ou seria já a final? Pois é, no filme isso não fica claro. A battle é bem interessante por sinal mas o torneio poderia ser explorado de uma forma mais coerente.

De facto, é uma pena que o filme tenha sentido a necessidade de se socorrer de tanto cliché a nível de história e plot devices para conseguir mostrar qualquer coisa de breakdance. No entanto, não deixa de ser um filme com um bom clímax - a B-boy battle.

Por: A. Silva e Joana Nicolau


Reportagem: Roulote Rockers no Hard Club (1/10/2010)

No Dia Mundial da Música, os Roulote Rockers actuaram no Hard Club, situado na Invicta. Coube-lhes a sorte de serem a primeira banda de rap nacional a subir ao palco após o renascimento do célebre espaço, agora do lado de cá do rio Douro. Não querendo faltar à chamada e assumindo também o privilégio de estarmos presentes na primeira noite de Hip Hop do renovado Hard Club, eu e o Sempei metemos os pés ao caminho.

Duas expectativas se geravam na nossa mente: ver pela primeira vez ao vivo Roulote Rockers, coadjuvados pela Banda Stuard, e contemplar o Hard Club, que foi como uma nova alma a entranhar-se num antigo corpo como é o Mercado Ferreira Borges. Quanto a Roulote, ficámos satisfeitíssimos. Relativamente ao Hard Club, idem aspas aspas.

Foi sob o cheiro ainda a tinta fresca que entrámos para a sala 2 onde pontualmente os músicos se posicionavam em palco para começarem a girar o funk, o hip hop, a soul, enfim, o que eles quisessem. Inicialmente o público era escasso mas assim que as primeiras notas musicais se foram soltando, mais pessoas entraram, certamente seduzidas pelas rimas de Logos, pelos “beats mais sujos” de Raez e pelo scratch de DJ Spark. Sem esquecer o decisivo complemento da Banda Stuard como é óbvio.

A música de Roulote Rockers sem dúvida que ganha uma maior intensidade ao vivo devido ao acompanhamento da banda. É toda uma pujança instrumental que lhe é conferida. Revisitando o seu EP de estreia, “Projecto de Sábado à Tarde”, só o single «Vício Chave» é que manteve o espírito do MC(‘s)/DJ, dispensando a colaboração da banda. Em qualquer dos casos, transpareceu sempre aquilo que importa: qualidade musical, dedicação plena dos intérpretes e divertimento.

Em resumo, foi um tempo bem passado, ao escutar boa música, em conhecer um espaço que todos esperamos que se torne marcante e onde os presentes pagaram somente 1 euro para desfrutarem do concerto. Que surjam, a breve trecho, novidades de Roulote Rockers, pois têm potencial e capacidade para continuarem a fazer óptima música e para darem um espectáculo de duração mais longa.

Austeridade

O Governo anunciou ontem uma série de medidas de austeridade, que vão mexer e muito nos bolsos dos portugueses, visando combater a crise económico-financeira em que Portugal mergulhou. É hora de apertarmos o cinto, dizem-nos. Mas não é isso que andamos a fazer há anos a fio? E a crise? Há quanto tempo estamos em crise? Já todos percebemos que vivemos em crise permanente e que não há governantes alguns que resolvam este problema de fundo.

O que vem aí então: aumento do IVA para 23%, cortes nos salários da Função Pública, cortes nas prestações sociais e nas pensões, congelamento de aumentos salariais... Em suma, os portugueses que já estavam mal vão passar a viver pior, com muitas mais dificuldades, com muitas mais pressões, vão verdadeiramente penar! Em abono de quê? Da satisfação dos mercados financeiros internacionais, da especulação, da redução do Monstro a.k.a. défice do Estado, do pagamento de taxas de juro mais baixas.

Os cidadãos vão pagar a sua factura. E os governantes, que lhes vai acontecer por deixarem chegar o país a este estado calamitoso? Vão continuar a viver como reis porque pouco lhes pesará no bolso a adopção destas medidas! Devia acontecer como com o governo da Islândia que por levar o país à bancarrota foi julgado em tribunal, foi responsabilizado! Aqui ainda temos de ver Sócrates do alto da sua importância a anunciar como suas estas medidas, quando toda a gente sabia da inevitabilidade delas! A sua maior culpa é ter consentido que chegássemos onde estamos: na lama.

Esta ofensiva aos trabalhadores só servirá para os deixar mais empobrecidos, fará aumentar o desemprego e como não há uma estratégia ou incentivos ao investimento e às exportações continuará a recessão. É preciso afastar estes políticos incompetentes que ao longo dos anos têm gerido as nossas vidas. São sucessivos os governos que não conseguem reformar a Administração Pública e que são incapazes de controlar as despesas do Estado, qual monstro insaciável.

Os mais desprotegidos da sociedade irão ser brutalmente castigados com este pacote de medidas. O aumento do IVA será terrível mas é a forma mais fácil do Governo ter dinheiro em caixa. Isto é, se não aumentar a evasão fiscal! O que parece muito provável e que deixará o Estado com um ataque de nervos pois as contas podem sair-lhe furadas, não encaixando o esperam.

A greve, a contestação, a união do povo serão algumas das formas de luta para se mostrar a indignação e a repulsa por estes governantes irresponsáveis, que urge afastar da esfera política para sempre! Erradicação, já! É toda uma política errada que vem sendo feita desde há muitos anos até esta parte. Os culpados têm de ser chamados à pedra. Nada mais pode ficar na paz do Senhor, nem a culpa pode morrer solteira! É preciso acabar com a podridão. O povo é que paga sempre a crise. Até quando?

Dado o arrastamento da situação que o país vem atravessando há longos anos, pensar-se-ia que o Hip Hop seria mais activo em arranjar formas de se manifestar contra este preocupante alarme social e safadeza dos governantes. Mas nem por isso. São poucos aqueles que dentro do Hip Hop se movem para não calar a sua revolta. É nesta hora tão importante, tão brutal, tão dolorosa, que todos somos chamados a intervir, a posicionarmo-nos. Não tenho dúvidas da força que o Hip Hop mostraria caso entenda fazê-lo, caso pretenda fazer essa tentativa. Claramente que há um longo filão para se explorar. É que chegou também o momento de sermos austeros, no que quer que façamos, com esses governantes de meia tigela que mentem com quantos dentes têm na boca e que nos obrigam a tamanho sacrifício. Eles deviam era lavar a boca com lixívia ou ácido de cada vez que falam em sentido patriótico para adoptarem medidas destas! Onde está o patriotismo deles ao fazerem tanto mal a este país, em levarem-no à bancarrota e em pedirem sacrifícios aos mesmos de sempre? Vassourada! Não lhes podemos dar paz! Teremos de ser nós o Tribunal que os julga! E sem demora.

Arte, Estética & Crítica

O que é a arte? Bem, esta é uma definição complexa, dada a multiplicidade de respostas. Genericamente, pode considerar-se como arte o fabrico consciente de beleza. A arte procura exprimir a realidade objectiva, assim como o Homem e a sua maneira de ver o mundo. Em todo o processo, aspira-se a que a acção revele sinceridade. A norma artística e universal, aquela que sobrevive a todas as flutuações do gosto, é a integridade do ser. Ou seja, é o Homem na sua compreensão total e a manifestação do universo em toda a sua verdade.

Modernamente, a racionalidade imiscuiu-se na realidade para que esta se tornasse cada vez mais compreensível aos nossos olhos. Numa obra, podemos vislumbrar sempre dois pólos: o artístico e o estético. O artístico refere-se à criação do autor, o estético é a realização empreendida pelo receptor, aquele que se confronta com a obra. Resulta daí o seu entendimento daquela peça artística, que pode perfeitamente dar azo a múltiplas interpretações mediante seja sentida por diferentes pessoas. É importante fazer notar que percepcionamos a beleza de modo espiritual e sensível porque a nossa inteligência para atingir essa percepção do belo precisa do concurso da imaginação. Assim, quanto mais perfeito for esse concurso, quanto mais inteligentes e imaginativos formos, tanto mais perfeito e total será esse encontro imediato com a beleza.

A crítica é a arte de julgar do poder expressivo das obras artísticas. Em boa verdade, o acto fundamental da crítica é o de dizer: isto é bom ou isto é mau. Isto acontece porque houve necessidade de fazer essa avaliação, a fim de se preservar e valorizar o que é belo. O crítico é aquele que faz o caminho inverso ao do artista. É aquele que contempla a criação feita e que abraçando-a procura explicar as sensações que derivaram desse abraço. A interpretação é ela mesmo um desígnio criativo. A obra torna-se um produto da interacção, do relacionamento, com o receptor. Se no criador de beleza há qualquer coisa de misterioso, no modo como nele andam unidos alma e corpo, também o crítico guarda a virtude imprescindível: a de saber ir ao encontro da significação da obra com uma natureza compreensiva, sensível e carregada de bom senso, que lhe permita fazer sobressair a verdadeira essência daquela obra no meio das muitas sugestões que lhe possam surgir diante. No fundo, a crítica é a arte de sentir, sendo certo que não existirá nenhuma norma absoluta para se julgar as obras de arte. Simplesmente, belo é o que agrada. Saliente-se a surpresa como o valor supremo do gosto: contraria o hábito, é algo que é estranho e que leva ao prazer, rompendo com o que se esperaria.

O Hip Hop é arte? Sim. O Hip Hop tem uma estética própria? Com certeza. O Hip Hop precisa da crítica? Claro. Porquê? Desafio os leitores do Bloggers Reign Supreme a expressarem as suas opiniões relativamente às perguntas que formulei. Têm a palavra!

Fenómenos

Quando pensamos em fenómenos vem-nos instantaneamente à baila na cabeça o Entroncamento e o futebolista brasileiro Ronaldo, que hoje até carrega mais a alcunha de gordo do que qualquer outra coisa. No entanto, há mais fenómenos para admirar. Particularmente no rap português. É o caso de Deau e de Bónus.

Ambos não têm álbuns ou mixtapes editadas em nome próprio. Só têm participações em compilações ou em álbuns alheios. Todavia, têm uma enorme e entusiasta trupe de admiradores por todo o país, o que é assinalável para quem nunca experimentou a edição de um trabalho individual. Há factores parecidos na vida artística de ambos, pontos de ligação, que certamente contribuíram para esta aura mística que envolve os dois rappers.

Na verdade, com tão pouco trabalho feito, já têm um vasto reconhecimento. Mas o que contribuiu então para isso, sendo eles rappers que estão, por exemplo, nos antípodas de NGA, que é um incansável trabalhador de raps? Claro que a aclamação de que gozam deriva do imenso talento que desde logo revelaram. Não podia ser de outra forma. A grande capacidade lírica deles capta-nos à primeira audição. Depois cria-se uma enorme expectativa sobre o que serão capazes de fazer a seguir, aguardando-se sempre uma surpresa brutal, capaz de nos deixar novamente rendidos às suas imensas qualidades.

Deau é mestre no freestyle. Bónus é mestre em captar o sentimento da ruas. Deau traz garra para o palco. Bónus traz mentalização nas rimas. Deau irradia espontaneidade e transpira emocionalidade pela pele. Bónus é um pensador social, um repórter dos bairros, de escrita refinada. Diferentes no estilo, com origens díspares, mas iguais no talento. Inteligentes, com flows atraentes e mensagens entusiasmantes, ambos já marcaram o rap português, mas prometem-lhe ainda muito.

Curiosamente, Deau e Bónus não se preocupam muito com a sua imagem e com a exposição do seu trabalho, o que é um facto interessante. Talvez isso até ajude a explicar a avidez, a permanente vontade, em saber deles, pois não nos desgasta a sua imagem e só nos aumenta a curiosidade em contemplá-la. Poderá ser uma estratégia ou não, mas é certo que ajuda a dar-lhes essa certa mística à qual atrás me referia. Numa era da internet e de exaustiva divulgação de trabalhos por tudo o quanto é redes sociais, Deau não tem Myspace e Bónus abandonou o seu faz muito tempo. Isto é elucidativo de que nunca precisaram disso para se darem a conhecer. Bastou-lhes umas meras colaborações para que o génio de ambos ficasse bem gravado na memória de quem os escutava.

Serão eles capazes de revolucionar o rap português quando aumentarem o currículo? Só o tempo o dirá. O que apraz mencionar é que se ambos continuarem a dedicar-se ao Hip Hop, todos ganharemos, devido às potencialidades que demonstram e por tudo aquilo que já representam. Sabe-se que ambos pretendiam lançar álbuns individualmente. Oxalá venham o mais depressa possível para as ruas e que vitaminem o Hip Hop português, fazendo dele um movimento cada vez mais fenomenal.


Portugalidade... numa perspectiva HipHopiana

“É cultural, fado, Fátima e futebol
Lança fogo no alto para entreter o povo todo
É a máxima de Portugal
É fundamental, subsídios para a corrupção
Lança fogo no alto para entreter o povo todo
É a sátira de Portugal”

in «Portugal Surreal» de Dealema

Neste trecho, Dealema identifica três particularidades do ser-se português. Com o fado, Fátima e futebol podemos explicar algo da cosmologia social portuguesa, à luz de um conjunto de práticas, de acções, geradas neste nosso espaço Portugal.

Estivemos sem respirar a liberdade, já após a Implantação da República, durante 48 anos (1926-1974)! Com esta privação de elevado índice temporal, é natural que marcas muito profundas persistam até hoje. O povo ficou com a sua vida afectada pois sofreu o autoritarismo, a castração e repressão, os excessos do nacionalismo, o drama do colonialismo e o conservadorismo de um regime com um impregnado teor católico e tradicionalista, comandado pela figura do grande chefe Salazar. A máquina repressiva, com a PIDE na dianteira, controlava as massas com a censura, com a propaganda do regime, semeando o medo e impondo a sua doutrina através de organizações como a Legião Portuguesa e a Mocidade Portuguesa. A moral reflectia-se nos princípios da Igreja Católica.

O totalitarismo e a consequente falta de pluralidade na sociedade portuguesa atrofiou, em grande medida, quaisquer proeminências ao nível das ciências, tecnologia e cultura. É que Salazar vivia aterrorizado com a modernização de Portugal, colocando-lhe rédea curta, sob pena de ver perder os valores religiosos e a componente rural e atrasada (com altas taxas de analfabetismo) característica do país. Assim, a transformação cultural não era uma realidade e o país distanciava-se cada vez mais do avanço dos restantes países europeus.

O fado é português. Logo, era uma marca patriótica e representava o tal tradicionalismo que ia ao encontro dos interesses do regime. Além disso, os fados faziam a apologia da vida madastra, pobrezinha, humilde, sofredora, que exige sacrifícios, mas sempre com a regra de ouro de ser politicamente correcta. Fátima também é conectável com as particularidades de ordem nacional e conservadora, representando aqui o aspecto específico da religiosidade. A divindade, a adoração, a devoção a Fátima seria a metáfora pretendida para o próprio regime. Salazar intitulava-se o “salvador da pátria”, engajado apenas com a nação, desejando a aceitação do povo, ainda que usasse a repressão para cinicamente a obter, assim como uma fidelidade sem limites baseada num cargo praticamente vitalício, onde toda a oposição era praticamente silenciada.

O futebol era tido como a componente lúdica, uma espécie de versão moderna dos circos romanos. As pessoas esqueciam a vida de miséria nos momentos em que se concentravam nesse desporto. O facto de os futebolistas portugueses mais os nascidos nas colónias serem de eleição e terem granjeado feitos e conquistas importantes, quer ao nível de selecção quer ao nível de clubes, ajudou a que o regime sentisse a tentação de espelhar essa glória e esse brio através dum forte apego, marcadamente oportunista e interesseiro. Aliás, fado e Fátima também eram uma distracção para que se camuflassem os problemas e o estado do país.

Mas hoje faz ainda sentido essa tríade? Se não faz, facilmente se encontram substitutos. Porventura, o fado já não goza da popularidade que tem actualmente a designada música pimba. Mas ambos os géneros se aproximam em certos pontos. A música pimba chega às massas, tem um cariz totalmente virado para o entretenimento e canta alguns tópicos da ruralidade vigente em Portugal. Ao contrário do fado, a música pimba tem a agravante de ter uma péssima qualidade. Apesar de sermos ainda um país muito católico e devoto ao culto de Fátima, mesmo quando as pessoas se desligam da religiosidade são-nos apresentadas “virgens” e divindades de carne e osso prontíssimas a estupidificar-nos! A máquina propagandística serve aqui os interesses económicos através da mediatização de certas pessoas, o que conduz à idolatração e à vontade de imitação, em virtude da condição terrena dos adorados. Todavia, a fatídica conclusão é que tal como em Fátima também aqui se vive a ilusão. E o futebol está tão na ordem do dia que nem é necessária profundidade sobre isto. Há intelectuais que o consideram como cultura. Mas é inegável que o futebol ainda hoje é usado e está próximo dos meandros políticos, correndo sempre o risco de ser instrumentalizado. Para além do pressuposto de continuar a ser o circo romano dos tempos modernos. Vide Cristiano Ronaldo em Madrid! As pessoas que assistiram à sua mega apresentação no Estádio Santiago Bernabéu, aquando da sua chegada ao Real, muitas delas são com certeza os novos pobres, vítimas do desemprego, que anseiam pelo “pão” mas que só lhes é dado o entretenimento, vulgo “circo”.

Em Portugal, onde o desemprego aumenta, assim como as desigualdades e onde a corrupção é uma realidade, a portugalidade ainda se reflecte nos pontos enunciados por Dealema. 36 anos depois do insípido período ditatorial, 36 anos depois de nascer o Hip Hop no Bronx, o nosso país mudou muito e depressa como sociedade em alguns parâmetros. Mas quem diria que a tal tríade – com algumas nuances atrás explicadas – se manteria ainda actual mais de três décadas depois?! Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é Portugal.

Cabe-nos a nós, geração do Hip Hop, pegarmos na filosofia que rege a nossa cultura e inspirarmos e ajudarmos este país a recuperar a decência. Que do Hip Hop, com este brilhante exemplo de Dealema, continue a brotar gente da estirpe de Zeca Afonso, de Fausto, de Godinho, entre outros, que ajudaram com a sua arte, com a cultura, a combater o mal instituído em Portugal. Porque todos queremos um país melhor!

Style Wars 2.0


Não. Style Wars não irá ter uma sequela nem um dos tão famosos remakes. No entanto, este texto explica-se através de duas razões:


  • Trata-se sim do reaproveitamento ou reciclagem de um texto acerca do mesmo tema, o qual fiz à 4 anos atrás

  • Surge também do facto de no início deste mês se ter realizado uma acção de beneficência para ser possível restaurar/conservar a película original e as muitas horas de filmagem não incluída neste lendário documentário.


Style Wars, foi um nome que sempre esteve presente no pensamento desde o meu primeiro interesse pelo graffiti. Recordo-me bem de ter lido uma entrevista ao lendário SEEN (na extinta e velhinha Subworld ( ver abaixo)) e a referência a este como um dos melhores writers da altura (King of the Kings).E eu, na minha inocência, continuava a questionar-me o que seria o tal Style Wars.







Mais tarde apercebi-me de que se tratava de um documentário acerca de graffiti e "algo mais" e depois de visioná-lo fiquei deliciado com o que vi. Está realmente fantástico pois contrapõem perspectivas dos writers, dirigentes autárquicos, polícia, críticos de arte, jornalistas, simples transeuntes, utentes do metro de NY e até uma mãe de um writer. E daqui surge o conceito ”Style Wars”. Da antítese de opiniões entre os writers e uma Nova Iorque inteira e da competição interna entre eles, num jogo de afirmação pessoal perante os seus pares. Portanto estávamos perante duas guerras de estilos: estética e de vida.

O documentário tem um fio condutor excelente e as explicações estão todas lá, obtidas a partir de um trabalho bastante pormenorizado e rigoroso, resultante da cumplicidade que o realizador Tony Silver e o fotógrafo Henry Chalfant foram fomentando com o evoluir do projecto.

O graffiti surge devidamente enquadrado na cultura HipHop, do qual são apresentadas as 4 vertentes com especial realce para o B-Boying, com filmagens da competição promovida entre RockSteady Crew e Dynamic Rockers. O djiing e mciing são apresentados quase como um só e o graffiti, era sem dúvida alguma, a “ovelha negra da família”, isto é, o mais controverso.

Tudo começa na década de 70, em Nova Iorque, por Taki 183 que inscrevia nas paredes o seu tag, ( nº era correspondente ao nº da sua porta), acabando com este a ser conhecido por toda a cidade. A moda pegou e a partir daí foi um festival de tagging, surgindo outros nomes como Papo 184, Junior161, Cay161, Stitch 1, e duas raparigas Barbara62 e Eya62. A partir daí os anos 70 ficam notabilizados como a década dos pioneiros e de desenvolvimento de estilos.

Uma nota especial, Taki 183,cronologicamente,não foi primeiro mas sim aquele que alcançou maior notoriedade tal como o documentário relata.

Somos confrontados com diferentes perspectivas de vários writers com destaque para Skeme, Seen, Dondi, Case2, Dez (actual Dj Kay Slay) e o odiado CAP.

É captada a preocupação de uma mãe e a sua oposição às actividades do filho (Skeme), mas não é por isto que este deixa de o fazer, sendo sincero com a sua mãe, não omitindo o seu estatuto de writer e as suas opiniões bem traçadas.

SEEN e Dondi já tinham uma reputação consolidada nas ruas, graças aos seus trabalhos não só nos comboios como em paredes da cidade. Aliás no documentário aparece-nos SEEN com colaboração de DUST na elaboração de um grande mural sob a observação de muitos mirones.

Case2 era um caso sério de talento apesar de só possuir um braço. Não o impedia de ter uma vocação notável para o graffiti, sendo altamente respeitado no meio pelo seus wildstyle fantásticos, por vezes praticamente ilegíveis, mas de uma qualidade tremenda.

DEZ, na época com uns tenros 16 anos, fazia-se acompanhar por TRAP de 14, ambos se distinguiam pela sua juventude, mas em toda a filmagem é recorrente encontrarem-se menores de idade com um conhecimento profundo das rotinas do graffiti nova-iorquino.

E finalmente, CAP. O mais controverso, o mais odiado, o mais solitário. O writer"mais" e já vão perceber porquê.
De entre todos aqueles que partilhavam aquela realidade, ele era simplesmente o mais detestado porque tinha uma personalidade muito forte e peculiar, consequente de uma postura perante o graffiti muito diferente e que chocava imenso com a restante classe de writers.

Por suas palavras, ele diz-nos que as suas preocupações estéticas e qualitativas no que fazia eram secundárias, o que interessava era a quantidade, o seu lema era “Mais e mais”, ou seja, não interessa a maneira como o faz mas sim o número de vezes que o faz. Foi aqui que começou a ser detestado pois a sua filosofia levava-o a crossar tudo e todos. Por vezes certos writers tinham acabado de pintar as suas peças e mesmo antes de os comboios saírem para circulação já as pinturas estavam crossadas. Provavelmente, a maior frustração de um writer devido ao desperdício de recursos e ainda por cima sem qualquer testemunho fotográfico.

CAP não demonstrava quaisquer remorsos e ele próprio não se designava como “Graffiti artist” mas sim “Graffiti Bomber” ou então por “King of Bombing”.

O documentário descortina também o preconceito de todo o writer ser negro ou hispânico porque também existiam muitos brancos a fazê-lo. Retrata igualmente as primeiras galerias de arte a acolherem e exporem graffiti e também a oposição do Mayor Koch e das autoridades (MTA) à actividade ilícita com todas as suas estratégias dissuasoras desde campanhas publicitárias, vedações duplas com arame farpado, cães entre as vedações e ainda limpeza regular das carruagens. Tudo isto contribuiu para o decréscimo da actividade e os comboios passaram a ser preteridos por outros suportes mais viáveis e menos problemáticos.

Estas medidas serviram eficazmente para diminuir a actividade em comboios mas isso jamais iria acabar com o graffiti, tal como comentaram os intervenientes no documentário, porque este já fazia parte da cidade e até se tinha tornado numa imagem de marca. Daí em diante foi-se reformulando e expandindo até se tornar naquilo que hoje é, apesar de todas as iniciativas para abafá-lo.

Hoje em dia podem encontrar facilmente o documentário pela rede. No Youtube dividido em partes e ainda com extras, incluindo entrevista com o realizador (já falecido) e alguns dos intervenientes passados mais de 20 anos.
Pedacinhos de história…

Entrevista a Tony silver
Skeme (…20 anos depois)
Style Wars Out Takes
Style Wars Outtakes (DONDI)

B-Boy Ken Swift ( …20 anos depois)

B-Boy Crazy Legs (…20 anos depois)

Style Wars ( Full Video )



Para terminar deixo uns versos que vi numa parede do Porto há uns anos.

"Graffiti é arte
Arte é cultura
Tentam abafá-la
Mas ela perdura!!!"


Nota final: Documentário imprescindível de ser visto...